25.9.17

Aquele cara

Eu o conheci no improvável. Entrevista de trabalho, em uma das piores áreas da Zona Norte do Rio de Janeiro. Ele me deu bom dia. Só isso bastou. Eu sabia, eu simplesmente sabia. Era ele. Que maluquice! Eu nem sabia o nome dele.
Voltei lá outras vezes. Descobri o nome, descobri semelhanças, descobri discrepâncias, descobri desejos. Descobri seu lado pervertido e seu lado metódico. Descobri que You showed me things they never told me at school podia definir muito bem. Também descobri o seu lado evasivo. Descobri que eu estava completamente perdida. E não sabia se poderia de novo me encontrar. Eu não sei.

Eu tive muitas fases. Já tentei deixar para lá, essa é a mais comum. Já estive despedaçada, já estive em negação. Hoje? Não sei. Eu não sei mesmo.
Você está linda, está cheirosa, está fresca, está naquele dia autolésbica de tão maravilhosa que está. Você está na rua dele, no trabalho, no mesmo horário. Não, você não vai encontrá-lo. Você vai encontrá-lo quando estiver suada, descabelada, correndo atrás do maldito ônibus que nem passa no mesmo ponto do que ele pega, mas ele estará nesse ônibus. Óbvio. Nada além do óbvio.
Você vai perder a fala, o raciocínio, o juízo, você vai querer sumir, mesmo sendo ao lado dele justamente o lugar que a qualquer tempo você mais desejaria estar. Você vai ter que administrar seu desejo, sua paixão, sua vergonha, sua fala entrecortada, a respiração falha. Algumas vezes em que o encontrei de surpresa tive até falta de ar. Sim, literal. E olha que tenho rinite, entendo dessas coisas.
Daquele jeito que dá dificuldade para andar, como se você tivesse corrido muito. (Mais do que para pegar aquele maldito ônibus. Agora imagine as duas coisas somadas. Bingo.) Você vai ter que administrar a mistura de vontade insana de pular em cima dele com a vontade de sumir e nunca mais vê-lo. A vida é isso: você simplesmente vai ter que administrar, mesmo estando no olho do furacão. Nas garras do leão, no meu caso.
Você vai gostar de muitas pessoas na sua vida. Ah, vai. Vai se encantar, vai sofrer, vai ouvir músicas improváveis. Isso é tão comum. As pessoas têm seus muitos interesses se você olhar bem. Se você for sociável, então, nossa. Uma paixão a cada esquina. O mundo é mesmo essa coisinha tão encantadora… Um viva à incursão antropológica.
Mas vai ter aquela pessoa que vai elevar tudo isso a um novo patamar. (Aquela pessoa que na frente dela você não consegue parar de passar vergonha, tipo a do ônibus.) Que te tira o ar, que te tira o tino. E como isso é literal. Isso é muito literal.
Vai ter aquela pessoa que te faz esquecer o que é um contrato mesmo estando com ele na mão. Aquela pessoa para quem você pode revisar um e-mail bobo mil vezes antes de mandar mas você não vai conseguir deixar impecável, mesmo sendo revisora. Maldita vírgula ingrata. Vai ter aquela pessoa que vai estar naquele maldito ônibus que você correu vergonhosamente para pegar.
Vai ter aquela pessoa que se passam meses mas tudo continua igualzinho. Que o toque não vai embora, que o toque é tão preciso. Aquela pessoa cuja boca te dá todas as respostas. Aquela pessoa do improvável. Dos encontros, dos desencontros, do reconhecimento. Aquele cara.
Definitivamente, eu não sei mesmo administrar nada disso.

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