25.9.17

E se... ou A única exceção

Texto mais antigo, original e na íntegra, do qual surgiram Enarmonia, Antonomásia, Desejo da noite (na taverna) e, em alguma medida, Não acredito em coincidências (todos no blogue, em Cartas a Elizabeth).
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Tinha dois aniversários no mesmo dia. Um estilo “balada”, outro, mais familiar. Eu estava mais para a segunda opção. Prometi que passaria no “balada” mais tarde, mas me despencar da Tijuca para Botafogo não estava em meus planos, muito menos para qualquer ambiente estilo inferninho. Depois do aniversário, meio alcoolizada, cedi às pressões de Ariel para irmos a uma boate.

Eu não queria mesmo ir para “balada” àquela noite.
Uma exceção.
A festa parecia boa, a variedade musical me agradava. Fechei a cara para todas as investidas que recebia. Sou meio chata para “ficar” com desconhecidos, e estava com isso aflorado aquele dia, nem beber (mais) eu queria. Mas bebi.
Exceção, exceção. Aqui começam os meus “e se” sobre este dia.
Não, não foi aqui. O meu primeiro “e se” foi aquela conversa com Ariel, em que resolvemos não só sair, mas ir exatamente para aquela boate. Poderia ser qualquer outra, não poderia? É, mas foi aquela. Ariel, frequentador assíduo. Eu, novata.
Eu não queria mesmo “ficar” com ninguém naquele dia.
Ah, exceção.
Eu jamais me lembraria de como foi. Mas ele “chegou” em mim, disso eu me lembro bem. “Hm, bonitinho. Detesto homem de touca”, medi hesitante. Mas que diferença faria? Era só mais uma boca. Bocas são tão banais. E se?. Ele não foi mais uma exceção. Ele foi toda a exceção do mundo.
“Eu tô aqui disfarçado”, disse ele depois do beijo, revelando cabelos enormes e todas as metáforas (im)possíveis. Mordida na bunda e marcas na tela. Gostos improváveis e referências trocadas tão óbvias. Alergias e outros desagrados. Tatuagem também é cicatriz perene, mas por opção. Cicatrizes outras nem sempre são assim tão opcionais. Na pauta da música ou do caderno, toda a simbologia do mundo.
Nada é definitivo, ou mordaz, a vida não é aquele corte bem definido. Tudo nada no caótico oceano dos muitos desencontros. Ele, mar de contradições e bagunça, é incisivo em me dizer que não acredita em coincidências. Eu, a detentora de todas as posturas sólidas e inabaláveis, só acredito na imersão no acaso. Viver deve ser uma surra de cruéis (in)contingências.
Hoje, vejo que os “e se” formam consequências da materialidade, em contraste às possibilidades dos sonhos. Das hipóteses. Efeitos das asas do acaso, efeitos dos pés da escolha. Ou da conjunção disso tudo. Na corda bamba das coincidências, ninguém tem manual de instruções. O eco de um sonho na sala dos espelhos, é isso o que os “e se” e as exceções no fundo são.
PS.: Se talvez te incomodar tanto quanto a mim a falta de concordância em “os 10% aumenta”, mas isso não te impedir de ver a beleza da “sofrência” por trás disso, talvez ter parado a tradução para escrever isso ainda faça algum sentido. E se você entende que apesar da “contraparte literal” da antítese anterior, ela é também uma metáfora sobre nossas formas de administrar e entender a vida (e, claro, de vivê-la), deveríamos pensar em um jeito de encurtar nossas atuais distâncias simbólicas, que há muito superam a física. Mais uma antítese do nosso “mise en abîme” dos sonhos…
Em tempo: parei a tradução também para publicar…

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