25.9.17

Foda poética

Era dia das crianças, com o feriado na sexta, e fechei contrato para os 3 dias com um shopping em uma região, digamos, bem afastada da civilização, nunca entendi o sentido daquele shopping no meio de uma estradinha simplória de terra. Levaria minha equipe para fazer teatro e animação, com direito a maquiagem artística, bola mania, brindes etc. Sempre gostei de trabalhar com equipe pequena, mas esse evento pedia mais gente. Então meu fiel escudeiro Bonilha arrumou mais dois candangos para o malfeito, um deles, lindíssimo. Alto, loiro, olhos entre verde e mel, de nome Mulher do Nem. Assim que o vi já pisquei. Que delícia aquele homem!

Tivemos alguns ensaios pra marcação das esquetes que faríamos, permaneci no maior respeito, afinal estava contratando ele. Fomos de maneira bem rústica pro local afastado, aquele galerão de ônibus, todo mundo abarrotado de coisa, tipo retirante (pena que não era colocante!). Como não sou dada a éticas, não consegui manter a postura por muito tempo, levei Mulher do Nem lá pro fundo do ônibus e já comecei a trabalhar nas agarradas. Mulher do Nem era ainda mais trabalhado na “guetice” do que eu, me virou de cabeça pra baixo e começou a me chupar. Eu, muito flexível, já lancei um 69 ali mesmo, no último banco do ônibus, que piroca linda! Tive que sentar, de costas pra ele e comecei as reboladas vorazes, dei uma cabelada nele e levantei a cabeça, quando olhei pra frente, vi Bonilha me encarando e rindo, pelo jeito a situação estava notável. Olhei pro lado e percebi que as pessoas nos ônibus em volta olhavam chocadas.
Vida e reboladas que seguem, não dava pra sair daquela espada do Rei Arthur de qualquer maneira, não. Mas muitas horas depois o ônibus chegou ao destino e a putaria teve que findar. Assim como o esperado, o shopping era rústico demais. Assim como todo aquele final de semana prestes a se desenrolar seria. Não teríamos camarim e o banheiro ficava a uns dez minutos de caminhada do lugar que nos foi designado para fazer os trabalhos, então tivemos que improvisar. Fizemos um varal e penduramos vários tecidos para formar camarim e coxias. Eu, bem clepto, tirei todos os rolos de papel dos banheiros e deixei na coxia para limparmos maquiagem e outros fins, foram tantos rolos que sete meses depois, mesmo fazendo eventos direto, ainda havia papel desse dia. Nos fantasiamos pra esperar as crianças chegarem. Mulher do Nem teria que se vestir de Chapolin, porém, viu um vestido vermelho que levei e se apaixonou por ele, não tirou mais o resto do final de semana. Entreguei pra Deus.
As crianças começaram a chegar e fomos fazer maquiagem artística. Irmão, aquilo parecia Gremlin, não parava de brotar criança, as mães berrando “meu filho primeiro, sua puta, tá na fila” e arrumavam confusão entre elas. Em dado momento, somente ouvi “você aqui, vagabunda, roubou meu macho e aparece aqui? Vou ralar sua cara de arrombada no chapisco, maldita” mal deu tempo de me levantar e elas já estavam se pegando de porrada no chão. Encrenqueira, a que iniciou a confusão, devia pesar cerca de 120 quilos, se jogava contra sua oponente que pesava por volta dos 30 kg. Não sei como aquilo estava se desenrolando. Fiquei impressionada como um ser humano podia produzir aquela quantidade de suor facial e sebo. Chamei os rapazes, separamos elas e fui tentar dialogar. “Isso daqui tá uma merda, me dá seu nomezinho, sua incompetente, que eu vou ligar pra central de vocês e reclamar com a dona”. Só pude rir, a dona era eu. Passei os dados. A reclamação era que estava mal frequentado.
Veio a hora do teatro e, como combinado com o shopping, fizemos Chapeuzinho Vermelho. Encrenqueira retornou pra cima de mim “Eu quero Patati Patatá, cadê Patati Patatá?” tentei explicar que a atração estava prevista somente para o domingo, porém um motim se formou e tivemos que adiantar para o sábado. Tive um comportamento bem nobre nesse momento. Deixei a galera lá fora fazendo a animação e se fudendo com as tretas e fui pra coxia chorar em posição fetal por aquela situação, eis que Mulher do Nem tava lá. Mal tive tempo de pensar, quando dei por mim dei pra ele. Ele estava numa cadeira e eu sentei no colo dele, de frente, cavalgando naquele mastro delicioso. No meio da emplacada, vem uma das meninas da equipe. “Gente, pelo amor de Deus, parem de trepar aqui, essa coxia tá transparente!!!! Estamos vendo tudo lá fora” me virei e notei que estávamos exatamente na parte da coxia que faltou pano e fizemos uma gambiarra com TNT verde-claro.
De fato, estava ligeiramente transparente. Me recompus e saí para ajudar na animação, nas fotos, vi a “recomposição”: descalça, descabelada e com maquiagem só na metade da cara. No sábado, já começamos com o bendito cover dos palhaços, me volta Encrenqueira “ô, essazinha, vi na “pogramarção” que Patati e Patata era [sic] só amanhã. Vou ligar de novo pra tua chefe pra “recramar” de você”. Não entendi porque a cidadã tinha cismado comigo, parecia que tava adivinhando. Ao fundo, um dos meninos que venceu uma brincadeira, estava esfregando o brinquedo que ganhara na cara do outro, que ficou puto e deu um soco no estômago dele. Eles começaram a discutir, as mães se meteram e novas cenas do programa do Ratinho se concretizaram ali. Apenas sorri, já tinha entregado pra Jesus, só queria que aquele tormento acabasse.
Deixei minha equipe seguindo com a esquete como se nada estivesse acontecendo – àquela altura, aquele tipo de cena tão recorrente já tinha se naturalizado pra gente – e reboquei Mulher do Nem pro banheiro. Irmão, que talento era aquele! Interpretava de Shakespeare a Zorra Total. Já foi logo me pegando pelos cabelos, me virando de costas, me jogou na parede, mordia e chupava minha nuca, foi descendo, me deu uma puxada que quando percebi já tava sentada na cara dele. Que chupada era aquela! Me sentia inteiramente contemplada! Regozijava em júbilo! Nada foi perdoado, levantei pra sentar no pau dele. Mulher do Nem segurou bem firme meu cabelo, olhou nos meus olhos e não perdoou nas estocadas, cutucavam meu útero sem dó, cada vez mais fundas “Sabia que Machado de Assis tem 3 fases?”, “Anão” pensei, não era possível. Já odeio Machado, vindo com comentário pseudo piorava, ainda mais NAQUELA SITUAÇÃO. “Anão, anão” era o único sentimento, não podia aceitar, mas ele continuou “Adoro Machado de Assis, mas gosto mesmo de Drummond”.
Cara, eu devo fuder muito mal mesmo, porque só isso explica essas coisas que me acontecem. Cu sinceridade! Tentei disfarçar, primeiro forcei sua boca contra a parede para que não emitisse som, mas ele entendeu como uma manobra selvagem, me virou e fez o mesmo comigo. Então forcei a minha boca contra a dele, mas não adiantava, ele aproveitava minhas deixas pra respirar e ia lançando “Eu te amo porque te amo, não precisa ser amante” cravava mais fundo “e nem sempre sabes sê-lo. Eu te amo porque te amo” dava um tapa na minha cara “Amor é estado de graça” chupava meu pescoço “e com amor não se paga”. E por aí foi, declamando toda a obra poética do “homem por trás dos óculos” e naquele momento foi a minha cara que ficou de “poucos e raros amigos”. Saí dali tão puta dentro das calcinhas com o ocorrido, que já fui dando um chega pra lá em Encrenqueira.
Acho que ela precisava disso porque ficou tão calminha que no mesmo dia se desmanchou em mil elogios pra empresa na nossa página do facebook. Fui comer com a equipe no final do sábado, um dos atores, que não parava de imitar o Silvio Santos, só falava em trepar ouvindo nothing else matters, e me fez ouvir uma versão estendida da música com meia hora de duração. Praguejei Renato Russo, Axl Rose e todos os filhos da puta que curtem “sinfonizar” música normal. A outra só falava que precisava “ir no estrangeiro” pra comprar “coisa barata” e Mulher do Nem veio se chegando do meu lado. Não tinha forças pra resistir e ele era gostosinho, estava irritada mas acabei pegando de novo.
No domingo, exausta do trabalho e depois de todas as rusticidades por que eu havia passado, estava sem forças de ir pro Shopping, mas não tinha muito jeito. Acordei e já me veio a bomba. 27 mensagens no zap zap de Mulher do Nem. “Puque fas isu?” eu pensava. Não contente com as mensagens não respondidas, também mandou alguns áudios. Só fingi que aquilo nunca aconteceu e segui pro shopping. Eram as mesmas pessoas dos dias anteriores, as crianças, as mães… Meu coração não conseguia aceitar isso. Só me perguntava porque Deus não me levava de uma vez. Exausta das cenas de “Casos de Família” que não paravam de ocorrer, liberei brinde pra todo mundo, até pras mães, que pareciam ser as mais interessadas até.
Fizemos um teatrinho de príncipe e princesa que terminou em uma guerra de água, tirando a bexiga com água que levei na cara e destruiu minha lente de contato, foi um momento de diversão, um alívio naquele final de semana. Mulher do Nem veio cheio das cobranças, eu, já sem saber o que fazer, recorri ao produtor do evento pedindo ajuda. Acho que ele não entendeu o tipo de ajuda que eu queria, pois logo depois daquilo vi ele e Mulher do Nem se pegando. Bem, pelo menos assim ele me poupava das fodas regadas a declamação do mais nobre da nossa literatura.

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