Ele me surgiu como as melhores coisas da vida, sem dar aviso. Como se tivesse sido condensado do ar, de algo que já estava lá e só me faltava perceber. Bom dia. (Ou seria bom-dia?) Foram as palavras que trocamos. Tive que virar a cabeça e olhar de novo. Nossa, pensei. Foram poucos segundos. Suficientes para minha mente formar aquela combinação de tatuagens, músculos, cabelo comprido, óculos e sardas. Puta merda. Óculos e sardas. Puta merda, puta merda! Para de olhar, cacete, você veio para uma entrevista de emprego, você está maluca?!, minhas muitas eus em guerra dentro de mim.
Republicanamente, desviei. Mas a imagem dele não saiu mais da minha cabeça por nem um segundo. Nem o facebook, paraíso dos stalkers da pós-modernidade, me deu alento naquele dia, eu nem sabia o nome dele.
Fiquei pensando em como faria para descobrir sendo discreta, mas não precisei de muito, meu chefe falava bastante dele – e em todas as referências eu me mantinha impávida, não queria dar nenhum tipo de bandeira, e tinha certeza de que minha cara denunciaria alguma coisa… – e aquele nome ficou ecoando na minha mente. Não era comum, eu conseguiria achar alguma coisa.
Aquele dia eu fui direto para o trabalho da Credis, já tinha comentado dele com ela – assim que o vi, mandei uma mensagem para ela no whatsapp, ah, as maravilhas da era da informação, do “tudo aqui e agora” de Lipovetsky! Disse que tinha descoberto o nome dele e reviramos o facebook. Eu não tinha um sobrenome, então cacei pelo perfil da empresa, encontrei.
Aquilo foi até pior, ter material de fotos intensificava o pensamento no dito cujo. Principalmente o que veio depois: pensamentos regados a livros e rock, combinação indecente. Ele não saía da minha cabeça, toda vez que eu o via tentava não encarar muito, no embate entre meu desejo insano e minha pretensa ética, mas ele não saiu um momento de mim. Eu cheguei a sonhar com ele.
E ele nem devia saber quem eu era.
Talvez fosse óbvio que rolaria. Talvez fosse o curso natural das coisas eu ter mais material para não parar de pensar nele: toques e cheiros. Desejo de passar o dia inteiro com a cara enfiada no cabelo dele somado à sensação permanente das mãos dele em mim. E escrevo isso aqui, agora, sob o céu estrelado do Hell de Janeiro, pensando na crueldade que é sua voz na minha cabeça (e eventualmente no meu fone) e sua escova de dentes no meu banheiro.
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