25.9.17

Quem dança mais nessa vida?

“Sinceramente, eu não sei quem dança mais nessa vida, se os sentimentais, os canalhas ou os canalhas sentimentais. Se as histéricas, as inteligentes ou as lindamente burras. Eu só acredito nos deuses que dançam, seja no terreiro, nas nuvens ou na pista. Não economize seus calçados, seus pés, suas dobradiças. Nega, contigo eu me derreto qual manteiga, porque eu tenho, tu tens, ele tem.”
Madrugada de um sábado para domingo, voltando de uma balada com um dos meus melhores amigos, me veio o poema que inicia “Tenho”, do Sidney Magal, na cabeça. Gosto bastante deste excerto, mas particularmente eu pensava no começo. “Eu não sei quem dança mais nessa vida, se os sentimentais, os canalhas ou os canalhas sentimentais.”

O mote de um arremedo de discussão começou por um beijo que dei em um estranho. Explico. “Cheguei” em várias meninas para esse meu amigo (e obtivemos sucesso), tudo estava na paz paradoxal do álcool-efusão-suor de um sábado, quando abordei um malandro qualquer: “Você é hétero?” Aí começou a desdita. Meu amigo emburrou a cara, quis ir embora na hora, saiu me rebocando entre irritação e alguma frustração.
Não, nunca tivemos nada e ele não é apaixonado por mim nem algo do tipo. Mas também não faz diferença, o ponto não é esse. O argumento dele foi que se sentia mal porque ninguém faria com ele o que fiz com o cara aleatório. Se já aconteceu de fato ou não com ele, pouco importa. E, cá entre nós, não foi nada no cenário de uma balada. Nem amor nem cilada. A banalidade das nossas “relações” contemporâneas imediatas e vazias.
Meu ponto são as muitas insatisfações sentimentais que temos, apesar da “oferta”. Antes disso, esse meu amigo tinha “pegado” umas três ou quatro meninas, lindíssimas, daquelas que a festa inteira quer, sabe? Mas não é suficiente. Nunca é suficiente. Existe o suficiente?
Fico me perguntando até que ponto esse vazio só é preenchido pela “coisa perfeita”, do jeito que a pessoa pré-planeja, nas horas e lugares devidamente encaixados e cronometrados, o pôr do sol angulando 30º no horizonte (aquela máxima de encaixar uma pessoa nos seus sonhos…).
Se esse vazio só é preenchido pelo total acaso e as surpresas que a vida traz, o que possibilita não buscar pessoas perfeitas embaladas a vácuo, mas construir o sonho depois de conhecer aquele “certo alguém” (sim, desculpem, sou uma romântica inveterada, como típica canalha que banaliza o sexo em um blog de contos eróticos humorísticos). Mas será que sabemos sempre estar integrais nesses acasos para aproveitá-los e vê-los? Para não perder aquele segundo tão preciso e só perceber depois que passou? E, não, ele não volta. (Isso aqui talvez seja ainda mais difícil do que a angulação perfeita do Sol…) Aliás, estamos/somos integrais em algum momento? O “segredo” é buscar a integralidade?
Tem ainda a terceira opção. Se esse vazio nunca pode ser preenchido nem sublimado. Por nada. Nem por aquela tal ideia de buscar no seu interior. Balela! História para vender livro de autoajuda, confiem em alguém experiente no ramo editorial. Afinal, quem é que tem acesso a essa caixa de Pandora que o ser humano é?
As pessoas preenchem os seus vazios de muitas maneiras, é verdade. Com relacionamentos (acepção ampla), com credos, com trabalho, com seus gostos, grupos e construção de identidade. É a tal forma de encontrar motivação e sentido na vida, ainda que a pessoa não se faça esse questionamento de forma consciente.
Mas, ainda assim, mesmo com esses “desvios de percurso”, tenho muito essa questão se esses vazios são de fato preenchidos. Mesmo quando são desmembrados para todas essas áreas ao mesmo tempo, ou extremamente concentrados em uma, do fanatismo religioso aos gritos inflamados de “Fora, Temer”, aos amores sufocados e eternos de um final de semana. Ou em todas as frustrações do mundo pipocando de um beijo em algum estranho em uma festa.
Eu não sei mesmo quem dança mais nessa vida, Magal. Mas, definitivamente, só acredito nos deuses que, mesmo vendendo quando dão, dançam.

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