13.10.17

1.169km

Eu não queria me apaixonar por uma mulher de outro estado. Ninguém quer; mas eu talvez não quisesse mais que qualquer um. Talvez fosse, nesse âmbito, tudo o que menos quisesse.

Coisas que me fazem sentir tolhido e que me direcionam são o gosto mais fugidio que já senti. Compromissos em seu sentido amplo. Uniformes e horários. Cumprimentos e a contagem dos dias. Crenças e estruturas morais. São prisões. São sempre prisões com que temos que lidar. Prisões a que nos acostumamos, que, no cotidiano, percebemos bem pouco. Que dificilmente nos apertam o colarinho.

Amar alguém é a gravata mais justa do que devia no pescoço. É a gola de número menor. É a sensação de entrar água no submarino. Você ainda pode nadar, as saídas são controladas e seguras na medida do possível. Mas você ainda está submerso. Ainda se move conforme a água permite e não na ilusão da autonomia ao nível do mar. E se apaixonar por alguém de outro estado é, além disso, areia entre os dedos no vendaval. É perceber o quanto os acasos nos escapam; mais do que todas essas coisas, que naturalizamos, nos fazem perceber.

Podemos evitar um certo nível de envolvimento, é verdade. Podemos não alimentar. Não olhar aquela foto mais uma vez. Pular a música. Fingir que não percebemos os trejeitos similares. Ou os que não têm absolutamente nada a ver, mas que mesmo assim ainda associamos. Podemos fechar o arquivo quando vem aquela vontade de escrever. Mas fazer sumir nós não podemos. E sempre vai ter aquele dia que vai incomodar diferente.

Olho com banalidade para todas as referências. Seu sobrenome incomum, seu cheiro particular, seus nomes. Sim, os dois. Que me aparecem em homens e mulheres, eventualmente em animais. As músicas e os cabelos compridos. Uma camisa que alguém ostenta do meu lado. São sempre segundos. Mas segundos de pura enxurrada.

Sigo buscando poesia em outras coisas, e eventualmente sendo encontrado por ela, sem buscar, o que é bom. Mas a verdade é [que eu minto, que eu vivo sozinho, não sei te esquecer] que meu coração está aí com você. O que posso fazer a respeito?

Já perdi as contas das vezes em que me perguntaram, e eu calo. Eu sempre calo. Porque o meu silêncio é antes de tudo para mim. Há pouco tempo me fizeram uma pergunta mais direta, como seria se você viesse para cá. Meus lábios soltaram em um ímpeto: "Ela nunca vai vir para cá."

Por que os vieses são sempre as respostas mais definitivas?

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Originalmente publicado em Sensations.

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