20.10.17

Aquele vestido

Sabe, acho que nunca te contei.

Na primeira vez que transamos, aquele vestido que eu estava usando caiu atrás da minha cama e esqueci ele lá. Não é muito higiênico contar que só fui achá-lo muito tempo depois, mas foi o que aconteceu. Eu me esqueci mesmo dele.

Semanas. Meses? Durante algum rompante de mudar móveis e ideias de lugar, eu o achei. E assim que o vi, tive que engolir o coração de volta. O vestido me trouxe você. Então o peguei. E tinha seu cheiro adocicado nele. No instante que senti, seu cheiro preencheu a casa inteira. E, embora isso tenha sido literal, vale como metáfora para todas as coisas: seu cheiro me preencheu por completo.

Obrigações de higiene me fizeram lavá-lo, é claro, mas tive um desejo momentâneo de deixá-lo ali mesmo, escondido atrás da cama; igualzinho a você guardado em mim. Grades vazadas fingindo latência. Até que algo, assim, desavisadamente, me mostre que você em mim é todo superfície. Meus poros e o seu toque. Saudade violenta.

Normal eu ter me esquecido do vestido lá. Foi a primeira vez que, de mais de um jeito, nos vimos nus. Aquele vestido - um dia tirado e jogado de lado - era minha maneira inconsciente de prolongar a sensação de você.

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Originalmente publicado em Sensations.

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