1.1.18

Me assina

O latim deu alma rubra à rubrica
Para apartar da sorte seu paredro
E sangrar o instante de toda fugaz sina
Porque também o destino é vicissitude
Que se dissolve como o rubro que tão transitoriamente
Me marca

Cruel fatalidade na tinta do meu corpo embarca
Te expondo minha nudez em plenitude
Dos meus lugares não visitados
Das minhas esquinas de vazios acobertados
Dos tão impermanentes cruzamentos
E das pensões de uma noite, em que nunca permiti estacionamento
Me rubrica

Assina minha nudez como sua
De todas as estradas que chamo de minhas
Tinge crua a ventura
E me trafega sem placas, multas, limites impostos sobre velocidade e trajetos
Me trafega na contramão
Me trafega nos mudos desafetos
Me trafega mesmo em estradas vizinhas
Me escreve

Se houver trecho sem asfalto ou quebra-molas inesperado
Segue
Não deixa de me percorrer pelos pedágios
Fazem parte de toda serra e todo campo aberto
Os obstáculos que mostram que estamos no caminho certo
Que se faz nosso por juízo
Quando o conquistamos
Me cartografa

Segue, na terra batida
No asfalto quente e repulsivo
Nas fechadas curvas repetidas
Na neblina que distorce em dúvida
Toda simulada ilusão
Caminha, vai
Empurra o carro onde não der
Troca a marcha
Me tinge, me tange, me tangencia
Que eu gosto mesmo do que não é
Que eu gosto mesmo é de não ter mapas
Me esboça

Rubrica o caminho como quem contrata
Que rubrica é tênue e irreconhecível para quem não sabe
Previamente do que se trata
Me autentica em tipografia
Como a falácia da lei em que se fia
Me decreta

Rubrica também é o que no teatro
Sem tato
Mostra que o sentido tem direção
Mesmo pra quem no mundo não se permite prisão
Soltos que somos como alheias adoção e consignação constantes
Decora meus bastidores errantes
Porque toda estrada, mesmo indomável, desconhecida ou por fazer... já tem nome
Me assina

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