29.1.18

Vendaval

As folhas das árvores batendo nos vidros da janela me levaram a fechá-la. No quarto, o assobio leve me protegia de uma realidade de areia no rosto e amêndoas sendo derrubadas com força dos galhos. Nada mais estaria como antes.

Eu tinha reescrito aquela mensagem para ela no celular, mas pegar no sono me permitiu adiar a decisão de enviar ou não.

Eu tinha escrito muitas coisas para ela. A maioria em tom acusatório, e ninguém que pleiteia vaga pode se aproximar em tom acusatório. Então me deixei naquele limbo entre a conformação e as muitas coisas que ficam para ser ditas. Será que ela também se via encurralada por esses dilemas?

Inúmeras vezes o trecho daquele livro me voltava.

- O perdão cura. Você não acha?
- Nem todo mundo está pronto para curar. Muito menos para ser curado.

E me trazia cenas rápidas em que nós duas tínhamos mais um período de trégua. Eu não vivia essas cenas; eu as sorvia, sugava, respirava. Eu não sabia ao certo se ali nada tinha acontecido ou se simplesmente não importava. Quando o perdão reina o passado desaparece? Será que um dia eu saberia essa resposta?

Eu acordei e ainda ventava. A inclemência dos ventos arrastando até as pedras do caminho me mostrava que a mudança acontece, mas nem sempre sob nosso controle.

A mensagem ainda estava na caixa de texto do celular. Mais uma vez, apaguei. A escusa da espera e do acaso, novamente, me protegia. Seria em vão. A brisa, dentro de mim, não existia.

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Texto escrito para o Desafio do Poligrafias - um texto por dia durante trinta dias com temas específicos e determinados. Meus trinta textos do desafio estão na categoria PoliDesafio.
Dia 1. Um lugar que só existe na sua cabeça.

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