2.8.18

Carta a um amor retardatário

Amor tem prazo, dia e hora. Tem lugar também.

Irônico pensar em quem me disse isso, de outra forma, e eu discordei. E eu ainda não consigo concordar, mesmo vendo o quanto isso tem de verdade. Mesmo vivendo isso, em certa medida. Essas palavras estão aqui há dias, semanas. Meses. Meses, e você sabe muito bem. Eu mesma relutei muito em ver e aceitar. Eu não queria assumir pra mim que, depois de tudo, isso realmente estava acontecendo. E por isso tentei.

Meses, desde o final do ano retrasado (!!!) eu tenho tentado. Desde aquele dia que banquei a louca e baixei naquele bar que você tava tocando pra te dizer que tava disposta. Você disse que eu estava diferente. Que tinha mudado. Não sabia explicar, mas "algo tinha acontecido". Eu insisti que eu estava lá e isso devia bastar. Você disse que devíamos viajar juntos, você sabe por que vacilei. Você sabe muito bem.

Você sabe também que eu tinha medo de ter algo com você de novo. Mas depois, sei lá, acho que eu devia ter feito antes, eu ia ter percebido. Ou não? Foi tudo no tempo certo? "Tempo certo" no nosso quadro atual parece até sacanagem da minha parte, não é? Mas talvez o certo seja esse mesmo, eu me fuder duas vezes, porque no final das contas é isso. Eu me fuder por você não querer me ouvir, me entender e fingir que não estava nem aí (olha, eu acreditei. Eu acreditei muito, você é bem convincente). E me fuder agora, por você vir desse jeito, falando e fazendo essas coisas e pra mim não fazer a menor diferença.

É uma ingratidão da vida.

Não é só com você, não, embora você pense assim. É ingrato demais pra mim também, "ter" você (é isso? Eu posso falar assim? Acho que sim, né?) desse jeito, agora, e não querer, ser inerte a qualquer sentimento que houve um dia.

O tempo da vida é errado demais. A vida toda é errada demais. Me pego pensando nisso. Ou que a vida é toda certinha, a errada mesmo devo ser eu. É só assim que sempre me senti em relação a você. Permaneço. Mas como vou ser "certa" agora se não faz sentido? Não é mágoa, não é raiva. Eu gostaria que fosse. Eu queria muito às vezes ter o sentimento de "agora você que vai sofrer", ou algo do tipo. Mas pra falar a verdade acho que isso é algo que nunca vou experimentar. Sei lá, não tenho esse tipo de orgulho. E você é a pessoa no mundo que menos poderia me acusar disso.

Meu Deus, eu fiz de tudo. Vai dizer que não? O que sinto é só um tipo de pena por não poder fazer nada. Não é pena de você, jamais seria isso, você sabe. É de mim. De tudo o que já senti um dia. Parece um desperdício, mas me entenda, por favor. O que eu posso fazer a respeito se há tempos já não faz mais a menor diferença? Eu sempre entendi os seus motivos. Você veio arrependido, e eu disse que não tinha do que se arrepender. Nunca tirei sua razão. Talvez o meu mal seja esse. Entender sempre. Às vezes entendo o lado dos outros mais do que o meu.

Eu tentei. Não sei se é certo dizer tentamos, são situações muito diferentes. Você sabe, eu tentei, mas já não dava mais, era diferente, tinha mudado. Você tinha se tornado um estranho, dos toques às conversas. E eu te falei.

Recentemente, um amigo meu me falou "ainda bem que você escreveu isso pra mim, pois você nunca ia conseguir falar" e isso é tão verdade. Só consigo organizar as coisas escrevendo, então aqui está, por mais que eu já tenha tentado te falar.

Você não acreditou, não foi? Achou que era jogo meu. Olha, eu mesma cheguei a pensar que fosse algum tipo de jogo inconsciente, confesso. Mas, não, não era. Eu não consigo fazer isso, já disse. Ou eu vou ceder, ou não. Se eu ceder, é porque algo em mim ainda vibra. Se não, não é jogo, orgulho ou o que quer que seja. É porque não tem mais nada. Fico incomodada com isso. Fico de verdade. É isso, é um desperdício. Eu sei que é. Eu sei muito bem tudo o que senti e como.

É tão estranho. Se eu pudesse, recuperaria algo do que você foi um dia pra mim, pra vivermos isso agora. É tão sincero isso, meu Deus! Se eu pudesse, eu faria, de verdade. Mesmo sabendo que você gostar de mim nunca foi/seria uma escolha sua. Não importa. Também não foi pra mim, mas, por muito tempo, ainda assim eu escolheria.

Agora você está disposto, agora você entende. Mas o que eu posso fazer a respeito, se não consigo mudar como me sinto? Eu não conseguia mudar antes, quando seu nome nos meus e-mail e na minha estante me dilacerava. Como conseguiria agora, que já revirei todos os livros, porque passou?

É estranho, é estranho demais. Tem uma eu no passado que em parte não acredita que isso está acontecendo. Em parte fica incrédula, porque não achava que era possível que passasse. Que você viesse desse jeito, quase como que uma mágica. E mais mágica ainda é pensar que, como falei, não é jogo, "vingança" ou o que quer que seja. Infelizmente, eu já não sinto.

Você sabe que tentei inúmeras vezes. Meses. E aí? Foi tão diferente de tantas maneiras. E você sabe. Acho que ninguém mais do que eu não queria que as coisas fossem desse jeito, será que você faz ideia? Mas eu infelizmente não posso fingir que ainda sinto, se não é verdade. Eu tentei. Meu Deus, você sabe! Tentei ver se sentia, se voltava. Ver se eu não estava só anestesiada, em negação, ou o que quer que seja. E não foi uma vez.

Acho tão louca essa sua ideia de "tem alguém". Não, não tem. Permaneço como sempre fui desde que nos conhecemos, desde sempre. Sozinha e afundada em trabalho, e sem querer que nada seja diferente disso. Sabe, eu até queria que houvesse alguém, às vezes é estranho achar que todas as pessoas são só uma massa embolada de onde nada se destaca. É toda essa anestesia.

Eventualmente alguém até se destaca, é verdade, você mesmo se destacou pra mim. Mas isso é tão raro. Não é isso. Diz respeito a mim, somente. Sou eu, isso é tão dolorosamente verdade. Me desculpa por isso, mas é nada. É simplesmente nada. Pode ter certeza de que eu nunca desejei/desejaria que fosse assim. Eu acho que você acredita, mas sei também que não entende.

Me perdoa.

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