Eu te imagino, eu te conserto, eu faço a cena que eu quiser.
A música que irrompe pungente nos arredores me aponta o dedo.
E me traz tudo o que há muito pulsa sob o tapete.
A hesitação do desejo. Não do desejo em si, pois ele é sempre faceiro, íntegro, escorreito. Mas hesitação dada pelos seus diversos figurinos. Os julgamentos. A antecipação de impossibilidades. A guarda engatilhada da recusa.
Fica a ambivalência.
A espera da concretude dada por qualquer força esotérica que de súbito me resgate.
Mas a verdade é que nada pode ser real até você permitir que seja.
E me vêm teu cheiro e teus ruídos, ainda que por imaginação forjados. Os cabelos e os cromatismos.
As dissonâncias que eriçam os pelos e o andamento particular. Imprecisão de instrumento não temperado.
Então detenho o castrador disparate por estrutura conhecido.
Do outro lado da rua, como que conjurado pelo meu desejo, você me sorri, os dentes sequiosos e a boca persuasiva, pórtico do teu universo. Inabitável. E eu intrusa fantasiando tuas entregas e teus convites.
Mas, não, não posso.
Essa ausência, de que tanto te acuso, escolhi eu por covardia.
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