17.2.22

Quinta-feira

Acordo antes do despertador, o senso de responsabilidade me chama. Só lembro que é feriado depois do banho, as rugas recém-surgidas que me encaram diante do espelho me forçam goela abaixo reflexões bélicas.

Me pergunto, eu, mais um de tantos, o quanto compactuo com a ânsia pelo tal propósito. E rio sozinho vendo o quanto, na tentativa vã de individualidade, sou só mais uma esponja da massa. Desejos iguais e olheiras mais fundas.

A realização é dada, não fossem as costas que viramos para ela, e ainda é preciso sorver o lirismo do cotidiano - todo o lirismo possível, aliás.

E, hoje, para mim era fácil. O Vivaldi que algum vizinho resolveu colocar em vez do sertacorno costumeiro. O pássaro que cruza as nuvens na vista indevassável do apartamento de andar alto. Virar a omelete inteira. O cheiro do café forte preenchendo a casa.

Vejo, tão fácil, que o medo é forasteiro, se faz hóspede por convite. E hoje aqui não havia vaga.

Acordo Elizabeth mole de sono na minha cama, cobertas e cabelos embolados. E a porrada de dopamina me socando o peito.

Tem dias, muitos deles, se não todos, em que ser feliz é escolha. Posso olhar as rugas e sua contraparte simbólica mais cruel, os arrependimentos, que continuarão aqui de qualquer forma. Todo epitáfio é escrito em vida, afinal.

Mas ainda escolho a nascente de todos os sentimentos e me permito desaguar no cheiro de sua nuca.

O meu oásis não é um feriado na quinta-feira. É ela.

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