27.3.22

Chegada

Foi como a conheci. Por trás daquele muro de vidro. Tocava a gaita cromática e tudo o que eu fazia era a sentir. O som não me chegava assim, da forma original, mas como a sensação reverberada por aquele escudo vítreo que nos apartava.

Ondas físicas, impressões de um som. Nunca ele mesmo.

Então um dia, como que presenteado pelo acaso, ela estava aqui, desse lado, do meu lado. Recostada no muro de vidro. Me inquirindo aqueles seus olhos de vírgula.

Tudo ao redor, de repente, tinha algo dela. Eu que sempre detestei a bagunça nos meus métodos tão sistematicamente ordenados, me vi pego em realização e paz.

As coisas dela ali, espalhadas pelos cantos mais improváveis da minha casa, tornavam patente essa latência de anos: o tanto dela que se espalhara e fizera morada nos cantos mais improváveis de mim.

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